quinta-feira, 6 de julho de 2023

O FUTURO DA RUA

 

É de saudar (conformemente à notícia do PÚBLICO de 30 de Junho) o aparecimento de um novo grupo universitário — The Future Design of Streets Association —, o qual pretende reflectir, como o indica o seu nome, sobre o futuro da rua. Mas será que a rua tem futuro?   Não o há‑de ter, por certo, se continuar a ser o que ainda é, ou seja, o cinzento canal rodoviário das deambulações pendulares da massa anónima dos subúrbios das grandes cidades.

Como a “ditadura do automóvel” é inseparável da ordem capitalista mundial, torna‑se quase evanescente a hipótese de uma retoma libertária da rua sem a recusa concomitante dos estilos de vida advindos de uma totalização mercantil da existência. Quer isto dizer que o futuro da rua, enquanto território do pensamento crítico, não constitui um domínio exclusivo de arquitectos e urbanistas.

Contra Le Corbusier, que perspectivava o projecto arquitectónico como um dispositivo anti‑revolucionário (“Arquitectura ou revolução!” — dizia ele disjuntivamente), devemos associar a arquitectura à revolução — que devolva a rua a todos (dos mais idosos às crianças). Para ser verdadeira, porém, tal devolução está longe de ser comparável com a transformação turística da rua, ou seja, com a sua espectacularização (mero suporte estético, como qualquer um de nós pode observar, de um urbanismo selvagem e especulativo). Disso mesmo é exemplo o restauro de fachada dos centros históricos das principais urbes do nosso país.

 

Eurico de Carvalho

 

In Público, n.º 12 119 (6 de Julho de 2023), p. 7.

 

 

 

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