sábado, 4 de março de 2023

A TAGARELICE DE BELÉM

 

Num contraste estratosférico com o perfil esfíngico e salazarento do seu antecessor, a figura de Marcelo lembra a irrequietude do pardal. A velocidade com que fala, aliás, de tudo e de nada, é estonteante. Salta de tema para tema como ramos da mesma árvore, plantando novas com a astúcia das velhas…

A tagarelice compulsiva não terá a particularidade folclórica de um certo mergulho no Tejo, mas já deveria ter merecido a atenção da Academia. Embora haja «cientistas políticos» a diagnosticar (com ar circunspecto e contrito) a perda presidencial de auctoritas e gravitas, tem sido muito curta a manta do Latim para tanta verborreia de Belém.

In extremis, talvez possamos trocar a ciência lusa pela filosofia alemã. Apelemos, pois, para o maior filósofo (segundo alguns) do século XX: Heidegger, o pensador da Floresta Negra. Na sua obra‑prima, Ser e Tempo, temos, pela primeira vez, uma objectivação fenomenológica da tagarelice, à qual corresponde, enquanto facúndia falaz e vazia, o sinal da inautenticidade.

Aqui fica, portanto, o conselho que dirigimos a quem queira compreender as aventuras e desventuras de Marcelo: «Leia Heidegger!» — E esta, hem?!

Eurico de Carvalho

In Expresso, n.º 2 614 (2 de Dezembro de 2022), p. 33.

Etiquetas:

0 Leituras da Montr@:

Enviar um comentário

<< Home