quinta-feira, 14 de setembro de 2023

A GRANDE ILUSÃO DOS MANUAIS DIGITAIS

 

Relativamente à colonização digital dos processos de ensino e aprendizagem, já são muitos os sinais vermelhos que emitem os países mais avançados nessa área. (Veja‑se o caso, por exemplo, da Suécia.) Pesem embora esses avisos, o Ministério da Educação insiste cegamente em experimentalismos tecnocêntricos, querendo agora acelerar a introdução dos manuais digitais no Ensino Básico.

Pois bem. Contra a digitalização dos suportes da leitura e da escrita, é preciso defender as virtudes didácticas do livro de papel. A sua linearidade, desde logo, facilita a assimilação da informação. Por não serem flutuantes, além disso, as suas páginas, temos a garantia de que esta estabilidade gráfica potencia a atenção, cuja maximização (indispensável à compreensão do que se lê) é o principal recurso pedagógico da aula. (Sem ela, realmente, nada funciona.) A tudo isto acresce, por outro lado, o relativo isolamento tecnológico do livro de papel, no qual não podem entrar (contrariamente ao que se passa com o livro electrónico) outros dispositivos, ou seja, susceptíveis de competir com a leitura, parasitando‑a irreversivelmente.

Em suma: não é pedagogicamente neutra nem positiva a transferência do livro para suportes informáticos, sendo previsíveis, de resto, as suas consequências perversas (equivalentes, aliás, nos domínios da leitura e da escrita, às que resultaram, no âmbito do cálculo mental, do uso precoce das máquinas de calcular).

 

Eurico de Carvalho

 

In Público, n.º 12 188 (13 de Setembro de 2023), p. 6.

 

Etiquetas:

0 Leituras da Montr@:

Enviar um comentário

<< Home