«ESTÉTICA,POLÍTICA E CONHECIMENTO — 8.º Seminário
Aberto de Investigação (2023)». — No âmbito deste
encontro, pronunciei, no dia 7 de Dezembro, pelas 16h, na Sala 1 de Reuniões da
Faculdade de Letras da Universidade do Porto, a comunicação que se segue:
«FOUCAULT E A FILOSOFIA — Em Prol
de Uma Leitura Kantianizante da Obra Foucauldiana.»
Para
os leitores desta Montr@, aqui fica o resumo da minha intervenção:
Eis
o nosso ponto de partida: «Qu’est‑ce que les Lumières?», de Foucault. Neste
opúsculo, que data de 1984 (o ano da morte do seu Autor), encontra‑se a chave
hermenêutica de toda a obra foucauldiana, com o consequente reconhecimento (às
avessas de certas aparências — literárias e historicizantes) de que é filosófico,
de facto, o seu estatuto discursivo. Enquanto filósofo, Foucault procede — aí —
à definição da própria Filosofia, retomando originalmente os termos do debate
aberto — em 1784 — pelo célebre artigo homónimo de Kant: «Was ist Aufklärung?» (É
de dois séculos, precisamente, a distância que separa ambos os textos.) Como
havemos de ver, porém, a leitura foucauldiana do opúsculo kantiano não consiste
numa reflexão comemorativa ou laudatória do movimento histórico‑cultural que se
chama (em português corrente) Iluminismo. Mas também não se trata do seu
contrário. Para Foucault, de resto, não faz sentido estar a favor ou contra as
Luzes. O que lhe interessa é
outra coisa: «La réflexion sur “aujourd’hui” comme différence dans l’histoire
et comme motif pour ume tâche philosophique particulière me paraît être la
nouveauté de ce texte.» Por isso mesmo, é no quadro histórico de
uma «ontologia do presente» que se deve compreender a urgência e o valor da
crítica filosófica. Mas a noção foucauldiana de crítica inverte efectivamente a
de Kant, não sendo, pois, de natureza transcendental. Enquanto Kant, com
efeito, pretende estabelecer os limites do conhecimento, ou seja, que não devem
ser ultrapassados (sob pena de dogmatismo) pelo discurso do filósofo, Foucault,
por sua vez, atribui‑lhe exactamente a tarefa de determinar o que hoje deve ser objeto de ultrapassagem. Neste
«kantismo inverso», altera‑se, portanto, o horizonte do trabalho filosófico,
tanto mais que os limites a ultrapassar já não se circunscrevem ao campo
cognitivo, mas respeitam a todo o domínio do pensamento. O que importa agora, para
Foucault, não reside numa analítica que determine abstractamente as estruturas
universais do saber; o que lhe interessa passa, antes, pela determinação das condições
histórico‑culturais da emergência de acções e pensamentos de que nos dizemos
sujeitos, mas aos quais, realmente, estamos sujeitos.
Como
contraponto à leitura foucauldiana de Kant, vamos propor, por outro lado, uma
leitura kantiana de Foucault. Deste ponto de vista, tornar‑se‑á evidente que
Foucault, malgré lui — e o seu
desprezo pelas narrativas modernas da emancipação da Humanidade —, não deixa de
ser um pensador da Modernidade.
Eurico de Carvalho
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